O GP de Mônaco de Fórmula 1 de 2024 foi um autêntico desastre. Por conta do acidente envolvendo Sergio Pérez e Kevin Magnussen logo na largada, os ponteiros da corrida trocaram de pneus por causa da bandeira vermelha, e a corrida acabou ali.
Mais: os 10 primeiros colocados permaneceram inalterados ao longo de toda a corrida, que só teve quatro ultrapassagens e nenhuma batalha real na zona de pontos. Uma prova totalmente insossa.
As novas regras para a temporada 2026 seriam anunciadas de qualquer maneira, mas chegaram em um momento em que todos se perguntam se a Fórmula 1 morreu ou se sempre foi chata desse jeito (e nós é que nunca tivemos a coragem de admitir isso).
Sobre as novas regras para 2026
O principal objetivo da FIA com as novas regras é aumentar as ultrapassagens em pista, na tentativa de oferecer um espetáculo mais vistoso para o grande público.
A ideia pode ser nobre, mas a sua execução beira ao patético. A principal mudança é o fim da insuportável asa móvel para a adoção de um “push-to-pass” que PREJUDICA o carro que está na frente, que é banido por ser melhor.
A seguir, de forma bem resumida, apresento as principais mudanças nos carros da categoria para 2026:
- Carros serão 20 cm mais curtos e 10 cm mais estreitos, para facilitar a aderência e as relargadas.
- Pneus serão 2,5 a 3 cm mais estreitos, para reduzir o downforce e aumentar a sensibilidade à aerodinâmica.
- Carga aerodinâmica 30% inferior e resistência aerodinâmica até 50% menor.
- Fim do DRS e adoção da aerodinâmica ativa com limite de potência.
- Piso do carro parcialmente plano e difusor modificado para reduzir o efeito solo.
- Motor com 50% de potência elétrica (aumento de 300%).
- Peso total do carro 30 kg mais leve.
O regulamento técnico mal foi anunciado, e já recebe críticas pesadas, tanto dos fãs da categoria como até mesmo da dona Red Bull, que ameaça deixar a categoria por causa das novas regras.
Se bem que… aqui já pode ser o Christian Horner chorando a saída do Adrian Newey, ou entendendo que as regras foram concebidas para prejudicar a Red Bull (e sempre foi assim; a Fórmula 1 sempre vai tentar barrar o carro que é dominante).
É cedo para dizer se as novas regras vão dar certo ou não. Aliás, as equipes se precipitam em fazer ameaças antes dos carros irem para a pista.
Mas é de se perguntar…
A Fórmula 1 sempre foi chata?
Depende do ponto de vista.
Se você acha que a categoria é chata porque tem uma equipe dominante, lamento em dizer, mas… sim… PARA VOCÊ, a Fórmula 1 sempre foi uma categoria bem chata.
Mas existem aqueles que entendem que essa é uma categoria que sempre entregou a tecnologia de ponta nos carros, as rivalidades mais épicas da história do automobilismo, vários momentos mercantes e memórias lendárias que vamos guardar para sempre.
Alguns dos campeonatos de Fórmula 1 são históricos, mesmo com algumas corridas que podem ser consideradas insossas. E sou resistente a aceitar a teoria de que ela sempre foi esse grande marasmo ou completo nada como vimos em 2023 (e 2024, mesmo com provas horrorosas, já entrega um campeonato mais competitivo que a porcaria que assistimos no ano passado).
Várias disputas marcaram a história da Fórmula 1 de forma definitiva, e ajudaram a construir a aura de categoria emocionante que criamos em nossa cabeça:
- O duelo Niki Lauda vs James Hunt (1976)
- A disputa entre Alain Prost vs Niki Lauda (1984, com Lauda conquistando o título por meio ponto)
- A decisão entre Prost, Mansell e Piquet (1986)
- O duelo entre Prost e Senna (1989)
- Todo o campeonato de 1994, apesar das tragédias
- A batalha entre Schumacher e Jacques Villeneuve (1997)
- A disputa inesperada entre Hakkinen e Irvine (1999)
- A batalha entre Alonso e Hamilton, que resultou no título de Kimi Raikkonen (2007)
- A disputa entre Hamilton e Massa, com um final épico (2008)
- O primeiro título de Sebastian Vettel, com uma disputa envolvendo cinco pilotos ao longo do ano (2010)
- O terceiro título de Vettel, em um campeonato intenso com final histórica (2012)
- O duelo entre Hamilton e Nico Rosberg (2016)
- A batalha entre Hamilton e Max Verstappen (2021)
Ou seja, nem sempre a Fórmula 1 foi a dominância insuportável de uma equipe sobre as demais. Alguns campeonatos foram marcados por disputas intensas pelo título.
O problema é que muitos de nós vivemos na nostalgia, e achava que a Fórmula 1 do passado era melhor porque tinha brasileiro ganhando todo domingo, ou porque “não tinha toda essa tecnologia”, ignorando que tudo o que existia na época era a mais moderna tecnologia em carros de corrida.
A nostalgia é uma merda, pois vivemos idealizando o passado
Viver de passado é seguir reciclando o lixo e achando que tudo o que passou era bom. E só quem não tem perspectiva de futuro faz isso na vida.
Muitos sentem saudades das corridas dos anos 70 e 80, com carros que tinham linhas mais limpas, motores turbo ou V10 e, em teoria, sem “aparatos tecnológicos”. Detalhe: já eram naves alienígenas conduzidas por pilotos supostamente heroicos… incluindo os cabeças de bagre que nunca foram nada na categoria.
O que ninguém se lembra é que essa mesma Fórmula 1 do passado que vivem endeusando já tinha poucas ultrapassagens e os vencedores davam uma volta em todos os demais competidores. E ninguém falava nada sobre isso, seja pela conveniência de recorte de narrativa, seja porque não tinha essa percepção da categoria na época.
Fato: a Rede Globo, canal que mostrou a Fórmula 1 na maior parte dos últimos 50 anos no Brasil, se valeu nos primeiros anos de compactos após o Fantástico ou de perspectivas (aparentemente) mais otimistas para apresentar ao brasileiro médio a categoria. E muitos dos mais velhos não faziam ideia do quão horríveis eram algumas corridas vencidas por Nelson Piquet e Ayrton Senna.
E um grande problema do sentimento de nostalgia é viver idealizando o passado como algo perfeito, o que impede a visão objetiva sobre uma Fórmula 1 do presente que é sim excelente, considerando toda a tecnologia ao seu redor e o nível dos pilotos que hoje estão no grid.
A Fórmula 1 precisa de mudanças (o tempo todo)
É claro que a Fórmula 1 precisa mudar, assim como qualquer coisa nessa vida que quer evoluir.
Os carros precisam oferecer a competitividade que os fãs esperam, mas não através da punição às equipes que melhor interpretaram o regulamento técnico. Do jeito que foi implementado o “push-to-pass” (reduzindo a potência do carro da frente), chega a ser ridícula essa novidade.
Por outro lado, gosto de carros menores para que algumas provas sejam melhores. Se Mônaco não pode deixar a Fórmula 1, que ao menos a categoria torne os carros minimamente viáveis por lá. Ou transforma essa corrida em evento especial, extracampeonato ou qualquer outra coisa que o valha.
O novo carro até que é bonito, mas as novas regras precisam ser colocadas em prática para constatar se teremos corridas melhores ou uma grande punição ao avanço tecnológico.
Se a Fórmula 1 sempre foi chata, isso é discutível. O que não se discute é que o campeonato de 2024 abriu uma caixa de Pandora da categoria que pode não ser fechado com tanta facilidade.
Até porque as corridas deste ano são horrorosas, e nunca ficou tão evidente que essa mesma Fórmula 1 precisa trabalhar com urgência em soluções para oferecer disputas mais interessantes.
Ou ficamos muito desacostumados com tudo o que vimos em 2021. Não descarto a possibilidade de todos terem se apegado à exceção e ignorado a regra.
O que também é algo absolutamente normal.
Foi a exceção.