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Zona de Interesse (2023) | Cinema em Review

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Eu decidi reescrever esse review, pois a A24 merece todo o meu respeito. Mais uma vez.

“Zona de Interesse”, filme com roteiro e direção de Jonathan Glazer, conta a surreal história (baseada em fatos reais) de uma família liderada por um militar do exército nazista que, ao lado da esposa e filhos, vivem uma vida aparentemente normal ao lado de um campo de concentração em Auschwitz.

O surrealismo do cenário é potenciado quando essa mesma família demonstra frieza e indiferença ao terror que acontece do outro lado do muro, já que abraça as convicções e ideais perversos do nazismo. E convivem com tudo o que acontece esbanjando simpatia e etiqueta, como se as torturas e mortes manifestas por gritos e tiros do outro lado do mundo simplesmente não existissem.

Pensar nesse cenário surreal pode não ser algo tão difícil assim quando pensamos naquelas pessoas que trataram com indiferença e deboche as mortes durante a crise sanitária global mais grave dos últimos 100 anos.

E onde “Zona de Interesse” realmente conquista (de forma cruel e sádica, devo admitir) é na capacidade de traçar paralelos com a nossa realidade prática recente. E, infelizmente, as comparações com aquelas pessoas que conhecemos e agiram exatamente da mesma forma são inevitáveis.

O cinismo, a hipocrisia e a falsa gentileza daqueles que se autoproclamam como “cidadãos de bem” escondem a monstruosidade da indiferença à dor do outro, abrigando o verdadeiro câncer de nossa sociedade.

Sei que é extremamente perigoso o que estou escrevendo nesta análise, mas é o que eu sinto depois de refletir profundamente sobre tudo o que eu vi em 1h47 de um filme denso, com narrativa lenta, complexo e cheio de camadas.

Jonathan Glazer fez um filme para os fortes. “Zona de Interesse” passa longe de ser um filme fácil de ser assistido, e pelos mais diferentes aspectos. É correto dizer que os conservadores descendentes de alemães que vivem em Santa Catarina vão simplesmente odiar esse filme. E, por outro lado, descendentes de judeus podem ter gatilhos emocionais pelas referências gráficas e sonoras do horror do Holocausto retratados no filme.

“Zona de Interesse” é bem ambientado, com uma produção que é relativamente contida e, ao mesmo tempo, esteticamente bem executada. Chama a atenção a proposta de câmeras fixas na maior parte do tempo, onde a audiência é um mero espectador dos acontecimentos, como se fosse um editor de um filme registrado o tempo todo por um sistema de câmera de monitoramento.

Não é um filme em que muitas coisas acontecem. Há quem diga que absolutamente nada acontece, e eu tive essa impressão durante a exibição do filme. Porém, quando olhamos para os detalhes da narrativa e identificamos as camadas subliminares dos recados que o filme quer transmitir, reconhecer o quão grande é esse filme (e essa história) é algo inegável.

Logo, é correto dizer que “Zona de Interesse” não é um filme para pessoas burras. Você precisa ter o mínimo de cérebro para absorver e compreender todas as nuances dessa história, pois poucas coisas ficam evidentes. Os plot twists do filme são entregues em cenas que não contam com falas objetivas.

Aliás, esse é um filme que não se explica por conta própria, e não conta com diálogos expositivos (exceto quando é extremamente necessário pelo contexto apresentado). Bem diferente de “Madame Teia” (e eu sei que essa comparação não é justa).

Por fim, “Zona de Interesse” é mais do que recomendado para quem tem estômago e capacidade cognitiva para absorver essa experiência que incomoda. É uma história que tira você de sua zona de conforto.

E o mais importante: conforme você vai pensando sobre o filme dias depois de assistir, a tendência é que você absorva ainda mais dessa experiência, compreendendo nuances e narrativas.

E isso pode promover algumas mudanças internas, incluindo efeitos colaterais indesejáveis no emocional e no psicológico de algumas pessoas.

Vale muito a pena. Mas… veja com moderação.


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@oEduardoMoreira