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Michael Jackson: o homem deve desaparecer, mas… e a sua música?

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Antes de qualquer coisa, eu quero deixar algo muito bem claro: eu considero o crime de pedofilia algo imperdoável. Não existe castigo forte o suficiente para fazer com que o criminoso pague por prejudicar uma criança nos aspectos físico, moral e emocional. E pedófilo para mim não merece perdão. Merece um tratamento psiquiátrico, e isso em minha opinião mais branda.

Logo, não vou aceitar qualquer tipo de distorção sobre a minha forma de pensar em relação a esse tema baseado em tudo o que vou escrever nesse post. O simples fato de apresentar a questão de uma forma mais elaborada e racional não dá o direito de qualquer pessoa afirmar que eu estou defendendo ou apoiando o ato de pedofilia.

Porém, é meu dever apresentar os vários lados da questão.

Eu não assisti ao documentário Leaving Neverland. Ainda. E prometo que vou assistir para depois deixar as minhas opiniões sobre o resultado final do conteúdo apresentado pela HBO. E não sou eu que vou fazer qualquer tipo de julgamento sobre o conteúdo apresentado. Posso me limitar no máximo em analisar o formato em que os seus responsáveis escolheram para expor os fatos.

Vamos aos fatos.

Eu amo a música de Michael Jackson. Ele é o maior artista musical da história contemporânea. Nos aspectos técnicos, ele é um gênio, em todos os sentidos. Fez história ao apresentar o Moonwalker ao vivo para o mundo, tem em Thriller o disco mais vendido da história, é o artista solo de maior projeção na indústria fonográfica, e produziu megahits que serão eternos, independente de qualquer coisa que venha a acontecer. Sua obra vai perdurar até o fim dos tempos. E nada vai mudar isso.

Porém, é evidente de Michael Jackson era uma pessoa excêntrica, para dizer o mínimo. Seu comportamento irresponsável com filhos, os hábitos alternativos para controle de sua imagem (em função do vitiligo ou pela necessidade de ser mais afinado), a sua irresponsabilidade financeira e, principalmente, o seu comportamento mais que suspeito com crianças eram elementos que levantaram críticas das mais diversas, e suspeitas muito pontuais por vários anos.

Quando alguém encerra uma disputa judicial pagando para a família da suposta vítima uma quantia generosa de dinheiro para que o assunto do qual aquela pessoa é acusada simplesmente desapareça, as chances dessa pessoa realmente ter cometido os crimes é considerável. Eu não posso acusar Michael Jackson de crimes de pedofilia, porque eu não tenho elementos de prova. Mas as inúmeras evidências deixadas por ele mesmo em seu comportamento e atitude só me levam a crer que as histórias relatadas pelas vítimas contam com elevada autenticidade.

Por outro lado, também é fato que Michael Jackson não está vivo para questionar ou se defender sobre os conteúdos apresentados em Leaving Neverland. O que deixa também a margem para, no mínimo, levantar a possibilidade que a HBO e os envolvidos nos casos aproveitaram o momento oportuno para explorar comercialmente a situação. Afinal de contas, não podemos nos esquecer que, uma vez que estamos falando de televisão, somos obrigados a lembrar que existem direitos de imagem e acordos comerciais estabelecidos entre as partes, e que algumas pessoas vão sair lucrando (e muito) com o documentário, e de várias formas.

Não é por nada que a família Jackson está processando a HBO em US$ 100 milhões. E não é por causa de um eventual acordo assinado pela rede de TV e Michael Jackson, vetando a produção de conteúdos sobre o caso. É porque bem sabemos que a HBO e os seus envolvidos vão faturar alto com o documentário.

Não quero falar de destruição da reputação de Michael Jackson. Mesmo porque ele mesmo será responsável por arruinar a sua imagem perante o grande público por causa dos seus atos. E, de novo, ele não deve ser perdoado pelos eventuais crimes que cometeu.

Mas é impossível não olhar para os detalhes sobre tudo isso.

A única validade que enxergo em Leaving Neverland é para ilustrar para a comunidade o quão escabroso é o crime de pedofilia, onde o documentário precisa servir de instrumento de alerta para pais, gestores públicos, educadores, religiosos e todos os membros da comunidade. O crime de pedofilia alcançou todas as esferas da sociedade, e cabe a nós, como integrantes do coletivo, combater e coibir tal prática. E o simples fato de um nome como Michael Jackson estar envolvido com esse tipo de prática já é mais que suficiente para adicionar elementos para uma observação mais cuidadosa para as práticas desse crime bárbaro.

Por outro lado, eu não consigo enxergar como válido o banimento de sua obra musical por conta de suas atitudes pessoais. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Até porque essas crianças não foram assediadas pela obra de Michael Jackson.

Há um movimento flagrante para banir a obra de Michael da história, desde o banimento de suas músicas em rádios na Austrália até a retirada do episódio de The Simpsons onde ele faz uma participação especial (S03E01), um dos mais queridos entre os fãs da série.

Eu entendo a revolta. Entendo que Michael Jackson teve uma postura questionável e lamentável, apesar de também entender que houve leniência de alguns pais, que também não perceberam (ou não quiseram perceber) que o cantor tinha um comportamento fora do normal ao agir com crianças. E insisto que nem mesmo tal leniência dos adultos justificam a pedofilia, que não pode existir e ponto!

Aqui, as únicas vítimas realmente são as crianças.

O que eu não entendo é essa tentativa de acabar com a arte, com a música. A música de Michael Jackson está acima de todos nós. Está acima dele mesmo. É maior que ele. Não dá para mudar o fato que Thriller é o disco mais vendido da história. Que Scream é um videoclipe espetacular, e que Heal the World é uma das mais belas canções pop da história. Pode ser uma pena que Michael Jackson tenha sido hipócrita em níveis elevados, a ponto de não praticar aquilo que cantou para o mundo. Mas nada do que ele fez invalida a grandiosidade de suas canções.

Por isso, acho fundamental separar mais uma vez a “pessoa física” da “pessoa jurídica”. O ser humano Michael Jackson deve sim ser esquecido e exilado pelo tempo. Infelizmente, ele pode ter cometido crimes que não merecem perdão. Mas a sua obra musical é intocável. É histórica. Definitiva. Existe, e será para sempre.

Mesmo porque quem assediou as crianças foi Michael Jackson. E não as canções Thriller, Bad, Jam, In The Closet, Scream, Black Or White, Beat It…


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@oEduardoMoreira