Os Razzies, também conhecidos como Framboesa de Ouro, representam o contraponto irônico ao glamour do Oscar, destacando anualmente as produções cinematográficas que ficaram aquém das expectativas.
A edição de 2025 não apenas cumpriu sua tradicional função de apontar os fracassos da indústria, mas também proporcionou um momento extraordinário que transcendeu a habitual zombaria, quando um dos maiores nomes da história do cinema transformou sua “derrota” em um manifesto artístico de grande impacto.
Até mesmo premiações negativas podem se converter em plataformas para discussões profundas sobre a arte cinematográfica contemporânea e os rumos criativos de Hollywood, estabelecendo um precedente incomum na história desta premiação controversa.
E tal discussão só poderia vir de Francis Ford Coppola.
O grande “vencedor” do Framboesa de Ouro
O grande protagonista da noite foi indiscutivelmente o filme “Madame Teia”, que dominou várias categorias e conquistou o infame título de pior filme do ano.
A produção baseada no universo da Marvel não conseguiu escapar do julgamento implacável dos votantes, confirmando as previsões negativas que já a acompanhavam desde seu lançamento nos cinemas. O fracasso foi tão contundente que Dakota Johnson, atriz principal da obra, também não escapou do escrutínio, sendo “reconhecida” como a pior atriz do ano.
O filme acumulou estatuetas em diversas categorias, incluindo a de pior roteiro, estabelecendo-se como uma obra que falhava em praticamente todos os aspectos considerados fundamentais para uma produção cinematográfica de qualidade – desde a concepção narrativa até a execução final, passando pela direção e interpretações.
Mas o momento mais emblemático e surpreendente da cerimônia veio de um nome absolutamente inesperado neste contexto: Francis Ford Coppola.
O lendário diretor de obras-primas como “O Poderoso Chefão” e “Apocalypse Now” foi indicado como pior diretor por “Megalopolis”, seu ambicioso projeto pessoal que dividiu opiniões da crítica especializada.
Em vez de ignorar a indicação ou demonstrar descontentamento, como seria esperado de um cineasta de seu calibre, Coppola transformou o momento em uma oportunidade para reafirmar sua visão artística e criticar o estado atual da indústria cinematográfica.
Em uma publicação no Instagram que rapidamente viralizou, o veterano diretor demonstrou um surpreendente senso de humor e uma profunda compreensão do significado de seu trabalho no panorama atual do cinema.
Coppola declarou estar “emocionado por aceitar o Prêmio Framboesa de Ouro em tantas categorias importantes” e sentir-se honrado pelas indicações em um momento em que, segundo suas próprias palavras, “tão poucos têm a coragem de ir contra as tendências predominantes do cinema contemporâneo”.
A declaração, longe de ser uma simples resposta bem-humorada, ecoou como um verdadeiro manifesto artístico, posicionando sua obra controversa como um ato deliberado de resistência contra a homogeneização criativa que muitos consideram dominante em Hollywood.
A reação de Coppola revela uma compreensão sofisticada do papel que um artista veterano e respeitado pode assumir no cenário contemporâneo: o de desafiador das convenções, mesmo que isso signifique arriscar sua reputação e enfrentar críticas severas.
Ao abraçar ironicamente o prêmio negativo, o diretor elevou o significado de “Megalopolis” além de seu valor artístico intrínseco, transformando-o em um símbolo da luta pela originalidade e pela visão pessoal em um ambiente cada vez mais dominado por fórmulas comerciais e decisões baseadas em algoritmos de sucesso.
Quem mais “venceu”?
Os demais “vencedores” da noite também trouxeram elementos dignos de nota para esta edição dos Razzies.
Jerry Seinfeld, uma figura icônica da comédia americana, foi escolhido como pior ator por seu papel no filme “A Batalha do Biscoito Pop-Tart”, demonstrando que nem mesmo celebridades consagradas estão imunes ao julgamento da premiação.
Jon Voight apresentou um caso peculiar ao ser premiado como pior ator coadjuvante por um conjunto de trabalhos em quatro filmes diferentes, ilustrando como uma carreira respeitável pode passar por momentos de questionamento criativo.
Outra categoria que chamou atenção foi a de pior casal na tela, que contemplou Joaquin Phoenix e Lady Gaga por sua controversa atuação em “Coringa: Delírio a Dois”. O próprio filme, aliás, também foi “reconhecido” como a pior prequela, remake, plágio ou sequência do ano, superando outros fracassos notórios como “Kraven, o Caçador” e “Mufasa: O Rei Leão”.
Precisamos do Framboesa de Ouro?
Os Razzies mantêm uma relação ambivalente com a indústria cinematográfica. Enquanto alguns profissionais e observadores os consideram uma forma saudável e necessária de crítica bem-humorada, outros questionam sua metodologia de seleção e o impacto potencialmente prejudicial que podem ter sobre carreiras e projetos.
A premiação já enfrentou diversas controvérsias ao longo de sua história, incluindo indicações consideradas de mau gosto ou excessivamente cruéis, levando ocasionalmente a reconsiderações e até retratações por parte de seus organizadores.
O legado desta edição de 2025 provavelmente será dominado pela reação singular de Coppola, que estabeleceu um precedente notável para como artistas podem ressignificar reconhecimentos negativos.
Ao transformar sua indicação em uma oportunidade para reforçar sua filosofia artística e questionar o estado atual da indústria, o diretor demonstrou uma maturidade e uma sagacidade que ultrapassam em muito o escopo usual desta premiação satírica.
Em um momento em que o cinema enfrenta uma série crise de originalidade, problemas com a diversidade de vozes e a falta de coragem criativa, a postura de Coppola ressoa como um lembrete poderoso do papel que cineastas veteranos podem desempenhar como defensores da arte cinematográfica em sua forma mais ambiciosa e desafiadora.
Os Razzies de 2025 nos mostram, paradoxalmente, que até os fracassos podem ter valor quando contribuem para discussões mais amplas sobre arte, criatividade e conformismo. Como observou ironicamente Coppola, é preciso notável talento para errar de forma tão grandiosa – e talvez seja precisamente este tipo de erro, nascido da ambição e da recusa em seguir fórmulas seguras, que o cinema mais necessita em tempos de crescente padronização.
Lista de Vencedores | Framboesa de Ouro 2025
- Pior Filme: Madame Teia
- Pior Diretor: Francis Ford Coppola (Megalopolis)
- Pior Atriz: Dakota Johnson (Madame Teia)
- Pior Ator: Jerry Seinfeld (A Batalha do Biscoito Pop-Tart)
- Pior Ator Coadjuvante: Jon Voight (conjunto de atuações em quatro filmes)
- Pior Atriz Coadjuvante: Amy Schumer (A Batalha do Biscoito Pop-Tart)
- Pior Casal na Tela: Joaquin Phoenix e Lady Gaga (Coringa: Delírio a Dois)
- Pior Prequela, Remake, Plágio ou Sequência: Coringa: Delírio a Dois
- Pior Roteiro: Madame Teia