Dá pra chamar de Inception neste caso?
O Kindle da Amazon é uma via acessível para ter milhões de livros em um dispositivo pequeno e portátil. Ao mesmo tempo, autores independentes podem publicar suas obras com facilidade e baixo custo, sem depender de uma editora.
Agora, some a democratização da publicação, a facilidade para escrever e publicar os livros e a malandragem criativa de quem usa a inteligência artificial para cortar caminhos, e temos o artigo de hoje neste blog: um livro criado por IA, que foi plagiado por IA para entregar um livro muito pior do que o original.
Uma Amazon invadida por livros falsos
A Amazon se tornou a casa de livros falsificados. Autores legítimos são plagiados por malandros que usam a IA para copiar o estilo de escrita para entregar livros falsos, com uma qualidade literária muito abaixo do original.
O ChatGPT é utilizado em escala (quase) industrial para criar textos que são mal elaborados e de baixa qualidade. E combinar isso com a facilidade de publicação de e-books permite que qualquer pessoa crie rapidamente um livro que vai competir com as publicações originais, de forma até desleal.
O exemplo que dou destaque neste artigo é o do jornalista Tae Kim e seu livro “The Nvidia Way”.
Ele escreveu um livro sobre Inteligência Artificial.
E o livro dele foi clonado, com outras pessoas assumindo sua identidade literária e publicando os e-books.
E a Amazon não faz nada sobre isso.
Ou melhor, não é eficiente nas medidas tomadas até o momento.
As consequências para autores e leitores
Os leitores estão percebendo que os conteúdos são de baixa qualidade, e deixam as críticas negativas na Amazon. Mas normalmente o linchamento virtual acontece com os autores originais, e não para os plagiadores.
Resenhas negativas atribuídas a livros falsos afetam, de forma injusta, a reputação do autor original. Além do ciclo vicioso de desinformação, o prejuízo acontece por algo que a vítima não tem o menor controle do que está acontecendo.
A renomada autora Jane Friedman denunciou os livros falsos com o seu nome na Amazon, e reclamou da falta de controles efetivos por parte da plataforma para lidar com as fraudes.
O problema de Jane só foi resolvido depois que a sua denúncia viralizou nas redes sociais. E só então a Amazon se deu conta de que precisa tomar medidas mais rigorosas para coibir o problema.
Diante do cenário caótico, alguns autores chegaram ao cúmulo de registrar os próprios nomes como marca registrada, apenas para se protegerem legalmente contra a suplantação de imagem que estão sofrendo.
Ou seja, quem tentar publicar um livro plagiado ou falso com um nome que é uma marca registrada será processado com maior facilidade, e vai lidar com as consequências legais desses atos.
E, mesmo assim: não é uma estratégia viável para todos os escritores.
Autores independentes não podem registrar seus nomes como marcas, e se conseguem alcançar o sucesso em vendas, serão plagiados do mesmo jeito, já que ainda são financeiramente vulneráveis pela própria independência editorial.
O que a Amazon vai fazer?
A Amazon reconheceu o problema e afirmou que está investindo em iniciativas para combater as fraudes dentro de sua loja digital.
Uma dessas iniciativas é o investimento de mais de US$ 1.2 bilhão em 2023 para especificamente coibir as fraudes, além da contratação de mais de 15 mil profissionais para lidar com os conteúdos falsificados.
Algo que parece não surtir efeito, já que os autores reclamam que é difícil remover os livros falsos da loja por causa da burocracia da Amazon em sua plataforma.
Produzir um e-book por IA é algo relativamente simples, desde que você respeite as etapas envolvidas no processo:
- Detecção de tendências através de palavras-chave que analisam os tópicos mais pesquisados na Amazon, gerando títulos otimizados para o SEO.
- Produção expressa via IA para criar rascunhos de livros, onde os chamados “ghostwriters” revisam o conteúdo gerado em um segundo momento.
- Marketing fraudulento, com comentários falsos para aumentar as classificações na Amazon de forma artificial.
- Distribuição em massa, com grandes quantidades de livros gerados por IA com preços baixos.
Nenhum autor legítimo pode competir com uma produção em escala industrial de livros escritos por uma IA. E a quantidade de livros ruins que chega ao mercado é enorme.
A Amazon vai precisar rever o seu negócio de livros digitais em função do avanço tecnológico. Precisa melhorar os seus sistemas para proteger os autores e, ao mesmo tempo, garantir a qualidade superior do conteúdo disponível em sua loja.
Além disso, uma regulamentação mais eficiente e mecanismos robustos de combate às fraudes são (obviamente) necessários para restaurar a confiança de todos, autores e leitores.
Ou vamos testemunhar uma gradativa degradação do conteúdo disponível na Amazon…
…que vai perder se ninguém mais comprar um Kindle para ler, ao entender que só recebe porcarias no dispositivo.