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FBI vs Anonymous: duelo de gigantes. E o monstro de várias cabeças está vencendo a guerra

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O que aconteceu no final da noite de ontem (19/01) na internet foi mais um capítulo da recente história da internet sendo escrita. É a prova que, mesmo com imposições de órgãos do governo e decisões polêmicas que superam o objetivo de combater a pirataria e adentram a ameaça da liberdade de expressão na internet, a própria web (e seus usuários) podem reagir de forma implacável, mostrando que no mundo virtual, os “políticos de mente arcaica” não são a força dominante.

Quero deixar bem claro que não sou contra o combate à pirataria, mas entendo que “pirataria” é algo bem diferente de “compartilhamento”. Mas acho que nem isso deve ser posto em discussão. Uma coisa que o FBI, gravadoras, produtoras e estúdios de cinema, e grandes indústrias de mídia se esquecem é o foco na fonte do problema. E é muito fácil culpar a tecnologia, os internautas, a internet, a mãe do João, que “fornece” para o leiteiro enquanto o marido está fora, ou qualquer ser terreno que se chama Mohammed. É fácil para essas entidades não admitirem que o erro está neles mesmos.

Uma prova que as pessoas estão dispostas a pagar um preço justo por aquilo que consome na web é o formato de vendas de músicas do iTunes. Depois de muita briga, a plataforma da Apple é hoje um sucesso, e serve de modelo para as demais plataformas que temos no mercado. Em teoria (é claro que toda regra tem sua exceção), as pessoas não são criminosas. Chamar aqueles que compartilham arquivos (e que consomem esses mesmos arquivos) de bandido e criminoso é algo pesado demais, e só aumenta a tensão entre aqueles que se sentem ofendidos. Aliás, a questão da pirataria deveria ser resolvida através da conversa, e não por rótulos.

Porém… estão fazendo tudo errado.

A indústria da música e do cinema perderam a queda de braço para a internet e a tecnologia. Os eventos provocados pelo Anonymous ontem são a prova mais clara disso. Antes, essa mesma indústria de entretenimento que ditava as regras, colocando o preço que queria nos seus produtos (muitas vezes, preços abusivos), hoje sucumbem de forma lenta ao streaming online, aos serviços de compartilhamento, e outras ferramentas que oferecem ao usuário uma maior liberdade de escolha. Se há culpados sobre por que chegamos a esse ponto, os culpados são justamente as gravadoras, as produtoras e estúdios de cinema e TV. Afinal, foram eles que ditaram as regras até o momento que a internet se massificou para virar o jogo.

Um texto publicado pelo The Pirate Bay sobre o SOPA (clique aqui para ler, traduzido em português) lembra muito bem que a mesma indústria do cinema que clama por “justiça”, se mudou para a Costa Oeste dos Estados Unidos (Hollywood), para não pagar direitos autorais para Thomas Edison, que desenvolveu na Costa Leste da América o conceito moderno de câmera de captação de imagens. Vale lembrar também que é essa mesma indústria que, através de lobbys e manobras comerciais, promoveu o crescimento de um império de mídia, que hoje é colocado em xeque, até mesmo pelos próprios “colegas” menores.

Nós bem sabemos o quanto que é dolorido ver que alguém pegou algo que não é nosso. E a indústria de cinema e música também está sabendo disso. Mas, ao invés de criar regras que efetivamente impeça que alguns lucrem com o trabalho dos outros, vem alguns congressistas norte-americanos, com idade avançada (nada contra os idosos, mas alguns políticos com mais de 65 anos simplesmente me irritam), escrevem uma lei igual a cara deles, para colocar em risco a liberdade na web dos EUA. Sim, porque, pela lei, se você compartilhar algo que eles entendem que o direito é de outra pessoa, você pode pegar até cinco anos de prisão.

Mas… o que seria “conteúdo autoral”? Um link de um site que eu republicar pode me mandar para a cadeia?

Pois é. O SOPA e o PIPA são leis mais “abrangentes” do que uma simples caça aos pirateiros. Para piorar as coisas, após um dia inteiro de protestos de internautas norte-americanos e do resto do mundo (sim, porque “vai que a moda pega” em outros países…) contra as tais leis em discussão no Congresso, os defensores da lei acreditam que os manifestos são “abuso de poder”. Vale lembrar para tais políticos da Idade da Pedra Lascada, que o direito ao protesto, à crítica, à manifestação pacífica, é algo GARANTIDO POR LEI em todo e qualquer estado democrático. E, até onde me lembro, os EUA não vivem uma ditadura, certo?

Aí, vem a “cereja do bolo”: o FBI fechando o Megaupload, um dos maiores sites de compartilhamento de arquivos do mundo.

É um direito do Governo fazer isso? Até é, uma vez que eles entendem que compartilhamento é crime. Porém, fazer isso poucas horas depois de uma mostra clara que ninguém quer que o SOPA e o PIPA sejam aprovados? É de uma burrice secular! E a reação foi quase que imediata, e com estragos consideráveis. O Anonymous realizou uma ação que, certamente, vai virar filme daqui a alguns anos (que irônico, não? A mesma indústria do cinema, que hoje chora as perdas, vai lucrar com isso), pois mostrou ao mundo que sua comunidade tem muito mais poder virtual que qualquer instituição governamental.

Ontem, o Anonymous foi mais poderoso que o FBI! Quem poderia imaginar isso?

Ver os sites de gravadoras, estúdios de cinema e TV, RIAA.com e até mesmo do FBI caindo, um a um, foi a história sendo escrita na tela de nossos computadores, smartphones e tablets. Acompanhar o Twitter ontem foi empolgante, e ver o envolvimento das pessoas nessa causa (isso, e as fotos da suruba no Facebook… é… o que as pessoas não fazem para aparecer na internet) foi algo importante para a web como um todo. Apesar dos obstáculos, uma parcela dos internautas estão se envolvendo mais, e manifestando de forma mais aberta que não aceita mais a forma como a indústria da mídia conduz as coisas.

A lição que fica dos acontecimentos das últimas horas é: “se querem mudanças, mudem o foco do problema”. E, nesse caso, a culpa é da atual indústria do entretenimento. É ridículo chamar o internauta de criminoso, ou culpar a tecnologia pelos prejuízos causados. É hora de repensar o negócio como um todo. É hora de diminuir preços, oferecer vantagens, estabelecer um formato de negócio com preços justos, para trazer esse mesmo internauta que faz o download no Megaupload de volta.

E vale lembrar: tal como aconteceu com o Napster, fechar o Megaupload não é a “solução”, viu, FBI? Fecham um, lançam outros 15. É um monstro com vários tentáculos e vida própria. E as chances dele se multiplicar e se tornar mais forte aumentam a cada dia.

ATUALIZAÇÃO:
sobre a carta publicada pelo pessoal do The Pirate Bay, é importante deixar uma observação pertinente. Conversando com um amigo (Fábio Barreto, do SOS Hollywood, que entende bem mais da história do desenvolvimento da indústria do cinema nos Estados Unidos que eu), tomei conhecimento que o The Pirate Bay não menciona em sua carta aberta que foi o próprio Thomas Edison que tentou estabelecer um monopólio da indústria de cinema, através da Moction Picture Patents Company, tentando estabelecer o domínio nessa indústria, por ser o único que tinha câmeras para produção de filmes. Na época, ele era o único que produzia e abastecia os cinemas, e aqueles que não aceitavam as suas regras, não poderiam reproduzir os filmes produzidos pelas suas câmeras. Os donos de cinemas que não concordavam com esse monopólio decidiram produzir os seus próprios filmes, criando a “Independent Outlaws”, na Costa Oeste dos Estados Unidos (em Hollywood), criando assim o embrião da indústria do cinema que temos hoje. Ou seja, Hollywood nasceu graças ao primeiro grande movimento independente do cinema norte-americano.


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@oEduardoMoreira