Sim, Fernanda Young… você tinha razão… nós, brasileiros, somos um bando de cafonas.
Nos tornamos cafonas, insensíveis e insensatos. Muito provavelmente nos tornamos tão socialmente irracionais quanto eram Rui e Vani, personagens que você ajudou a construir em Os Normais. O mais bizarro de tudo isso era que nós, ditos brasileiros normais, gargalhamos por três temporadas de nossas próprias mazelas morais, éticas e intelectuais.
Nos esquecemos que sofisticação é, por exemplo, procurar a informação correta. E não estudar sobre a história do Brasil em canais de vídeos do YouTube que são tudo, menos fonte de informação. Ser sofisticado é ter consciência sobre o que a Floresta Amazônica representa para todos nós. Ser brega é não ver que a destruição da floresta só aumentou nos últimos oito meses (e buscar culpados no passado para explicar a destruição do presente).
Fernanda Young estava certa. Nos tornamos cafonas, bregas, insípidos. Vou além: nos tornamos intolerantes, irracionais, preconceituosos. Na verdade, o brasileiro médio sempre foi assim. Só foi descortinado. Há uma diferença entre rir de nós mesmos e rir dos nossos próprios pré-conceitos.
Você tanto conhecia essa diferença, que fez de Os Normais um grande sucesso. Você usou a todos nós, brasileiros sofisticados e cafonas, para contar as suas histórias. Que contavam, em muitas vezes, o pior de nós, brasileiros. E conseguimos rir disso.
Não só Os Normais.
Como Sobreviver Ao Fim do Mundo, Comédia da Vida Privada, Os Aspones… tantas histórias que você contou, mostrando em várias vezes o quanto somos imperfeitos, falíveis, anti-éticos, desonestos e, principalmente, cafonas. Você tentou fazer com que mentes cafonas se tornassem sofisticadas através do humor ácido e crítico.
É uma pena que os cafonas não entenderam você.
Você, Fernanda Young, ficou sem ar e desapareceu de nossas vidas, e agora nós, brasileiros sofisticados (e alguns dos cafonas), ficamos sem ar. E todo ser sofisticado sabe que, sem o oxigênio, o cérebro para de raciocinar e, de forma inevitável, temos a morte cerebral.
O Brasil teve uma pequena morte cerebral nesse final de semana. Justamente agora, que é quando mais precisamos de mentes críticas, com falas fortes e diretas. Fernanda Young vai embora, mas deixa sua obra que inspira os sofisticados a se manterem elegantes nos discursos que levantam a discussão do coletivo, através da música, da escrita, da teledramaturgia, do cinema ou em qualquer outra expressão de arte.
Quanto aos cafonas? Jamais vão entender esse texto. Que dirá entender a sofisticação de Fernanda Young.
Texto baseado em “Bando de Cafonas”, última coluna de opinião de Fernanda Young para o jornal O Globo.