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Bob Marley: One Love (2024) | Cinema em Review

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Bob Marley é um dos músicos mais relevantes do Século 20. Ele é um vencedor da própria história por excelência, e motivos para isso não faltam. Um rapaz negro, que cresceu em uma família pobre sem saber quem era o pai, em um país que lutava por sua independência da Grã-Bretanha e, contra todas as probabilidades, prosperou no mundo da música tocando reggae e promovendo o movimento Rastafári.

Em um mundo ainda mais preconceituoso e opressor que vivemos hoje, quais seriam as chances de alguém como Bob Marley ser admirado inclusive pelo povo europeu que colonizou e escravizou a Jamaica, criminalizando essa filosofia de vida que pregava o amor e a fé, ao mesmo tempo em que lutava contra todas as formas de sistema que dividia o seu país em espectros políticos opostos, que dominavam e escravizavam o povo através da violência?

Tudo o que coloquei até agora são motivos mais do que suficientes para validar a existência de “Bob Marley: One Love”, cinebiografia que é uma declaração de amor ao artista que viveu com intensidade tudo o que cantou.

Mas essa história é ainda mais interessante quando decide contar o momento mais importante da vida desse ser humano singular: entre o atentado que ele, sua esposa e a banda, The Wailers, sofreram na tentativa de promover a pacificação dentro do seu país até a efetiva realização do concerto, que unificou líderes de partidos opostos em nome da paz.

Entre os dois eventos, Bob Marley teve que se redescobrir como pessoa, transformando a sua produção artística em missão. Inspirado na espetacular peça “Exodus”* composta por Ernest Gold para o filme de mesmo nome (de 1960) que, por sua vez, contava a jornada de judeus sobreviventes do Holocausto que buscavam refúgio na Palestina (sob o domínio britânico na época), Marley e a banda decidiram transformar o seu álbum “Exodus” uma marca, um presente para o mundo.

O resultado foi “apenas e simplesmente” a produção do disco de reggae mais relevante da história. E, dessa forma, o “colonizado” e “escravizado” Bob Marley conquistou os “colonizadores” europeus com a sua música com mensagens diretas e, ao mesmo tempo, profundas.

Ao longo da jornada em Londres para a gravação de “Exodus”, Bob Marley entendeu melhor suas origens (etíopes, e não britânicas como ele imaginava), identificou suas fraquezas, coletou derrotas, encontrou o sucesso e conheceu o câncer que o tirou desse mundo em 1981. Aliás, para os mais preocupados com a humanização do personagem central, saiba que esse filme passa longe de “santificar” Bob como “Elvis” e “Bohemian Rhapsody” fizeram com Elvis Presley e Freddie Mercury.

O Bob Marley interpretado por Kingsley Ben-Adir é crível. Você sente empatia por aquela pessoa, que entrega boa parte das posturas e comportamentos do cantor. Aqui, vale o registro de que o trabalho de Kingsley se evidenciou com a parceria da sempre muito competente Lashana Lynch, que interpreta a esposa de Bob.

“Bob Marley: One Love” é um filme redondo e extremamente competente. Tem um design de produção impecável, com uma ambientação dos anos 70 que transporta a audiência em uma espécie de viagem no tempo, que é visual e sonora, entregando a experiência completa.

Seu roteiro é bem cuidado, e a decisão em escolher qual é o período da história de Bob Marley que quer contar é acertada. Mesmo com uma vida curta (o cantor faleceu com apenas 36 anos), os momentos mais intensos e relevantes foram durante essa passagem pela Europa, culminando no concerto histórico em seu país. E isso é retratado no filme de forma muito competente.

Mas o mais importante em “Bob Marley: One Love” é que esse filme tem a “vibe Bob Marley”, algo que se explica porque Ziggy e Rita Marley são dois dos produtores do filme. Mas também porque essa história foi contada com muito amor e entrega por parte de todos os envolvidos.

Você sai do cinema plenamente satisfeito com o resultado entregue. A sensação é que esse filme te abraça de tal forma, que se torna quase impossível não se tornar fã de Bob Marley depois de testemunhar a sua missão em lutar contra o sistema através de mensagens de paz e amor.

Você volta para casa com a certeza de que a música de Bob Marley não só é atemporal, como também necessária para o tempo presente que vivemos.

“Bob Marley: One Love” não é um musical. Logo, não se preocupe em encontrar diálogos com pessoas que começam a cantar do nada para pedir dois ovos com bacon no café da manhã. A música aparece quando precisa aparecer, e sempre em função do personagem central que, oras bolas, é um cantor.

Logo, encare esse filme como um drama biográfico. Ou encare como uma espetacular forma de conhecer um dos artistas mais importantes da história da música, em seu capítulo mais importante durante sua jornada terrena.

Você não precisa ser um profundo conhecedor sobre a história de Bob Marley para assistir ao filme. Aliás, a experiência se torna bem mais interessante para quem não é fã do cantor ou de música reggae, especialmente se você é uma pessoa aberta para receber o novo na vida.

Mas… para os fãs incondicionais desse artista lendário, “Bob Marley: One Love” é obrigatório.

Por fim…

Como alguém que faz música desde os 16 anos de idade, e encontrou nessa expressão artística uma ferramenta de salvação, “Bob Marley: One Love” me entregou lições preciosas para muitas coisas.

Reforçou em mim a convicção de que a música é uma das formas mais poderosas de autoconhecimento, reflexão e propagação de mensagens positivas que a humanidade criou. Me lembrou de que ser uma pessoa boa não exige esforço ou grandes fortunas, mas sim o abraçar sincero de uma filosofia de vida.

E que combater sistemas opressores com mensagens de união e fé através da música é algo mais revolucionário e ameaçador para as mentes presas na ignorância do que segurar armas e ameaçar pessoas que não contam com qualquer tipo de poder para se defender.

Bob Marley foi um herói do povo jamaicano cantando o que viveu e acreditou. E compartilhou com o mundo valores que perduram até hoje, mas que muitos de nós fingimos ser surdos para não ouvir ou aprender.

Ao longo de quase duas horas de filme, eu pensei muito em uma pessoa que, de forma natural e espontânea, me lembra de tempos em tempos que ser bom vale a pena… porque sim.

Eduardo Aquini… se em algum momento você encontrar esse conteúdo na internet, saiba de uma coisa: assistir “Bob Marley: One Love” me deu a resposta para uma das perguntas mais intrigantes que rondaram a minha cabeça desde que me mudei para Florianópolis em 2018…

Por que você é a melhor pessoa que conheci em Floripa nos aspectos morais e éticos?

Meu amigo Eduardo… pode acreditar em mim… ouvir reggae uma vida inteira ajudou a moldar o seu caráter e sua personalidade. Você não só ouviu as músicas. Você escutou, compreendeu e absorveu as letras.

Eduardo Aquini… você é rastafári. E fique muito feliz com isso.

 

P.S.: *duas curiosidades para quem chegou até o final deste conteúdo: 1) um dos produtores executivos deste filme é ninguém menos que o ator Brad Pitt; 2) o tema de “Exodus” de Ernest Gold possui muitas similaridades com o tema principal de “Os Vingadores” composta por Alan Silvestri. Pode ser mera coincidência ou intuição musical (que é quando você tem a referência de algum lugar porque já ouviu aquela sequência de notas em algum momento), mas a referência é inegável. Basta ouvir os dois temas musicais.


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@oEduardoMoreira