
O Japão é um verdadeiro parque de diversões para quem ama tecnologia. Videogames, aparelhos eletrônicos, smartphones, computadores… a impressão que fica é que o céu japonês dos gadgets é o limite, e pode ir além, dependendo de sua devoção pelos eletrônicos.
Mas se há um lugar que simboliza essa obsessão de forma única, esse lugar é Akihabara, o coração eletrônico de Tóquio. Famoso por sua devoção aos videogames, mangás e cultura geek, o bairro também abriga um submundo fascinante: as chamadas “lojas de lixo” — nome que, longe de afastar os curiosos, atrai uma legião de caçadores de relíquias digitais.
Vamos dar uma olhada mais de perto nas “junks”, pois podemos encontrar nelas relíquias tecnológicas e pequenos capítulos do nosso passado geek. Aqueles itens que não poderíamos comprar na infância porque éramos menores de idade e não contávamos com cartão de crédito.
Akihabara: onde o lixo vira tesouro

Essas lojas de lixo eletrônico são bem mais do que aparentam, e se tornaram pontos turísticos de estrangeiros em Akihabara.
São verdadeiros labirintos apertados, abarrotados de caixas, prateleiras e estantes repletas de aparelhos esquecidos: celulares com tela rachada, tablets que não ligam mais, consoles que ninguém quis consertar e vários outros itens que, em alguns casos, ainda estão funcionando.
Tudo isso é vendido com um aviso claro: sem garantias, sem devoluções. Você compra por sua conta e risco. E ainda assim, não é raro encontrar verdadeiros achados por preços simbólicos.
Os japoneses não usam o termo “junk” à toa. Por lá, a classificação J é oficial: é o último degrau antes do descarte, abaixo dos já conhecidos graus A, B ou C, como em outras lojas de usados do país.
A diferença é que, nas junk stores, você aceita o desafio. Muitas vezes, o defeito é estético ou até mesmo incerto — e é nesse campo nebuloso que mora a graça de visitar um local como esse.
A cultura do reuso elevada ao extremo

O Japão tem um dos mercados de segunda mão mais ativos e organizados do mundo. A preocupação com a preservação, a obsessão por organização e o amor pela tecnologia se misturam para dar vida a essa cultura única.
Por isso, mesmo os produtos “descartados” acabam ganhando uma segunda chance. E isso pode se converter em economia para o comprador, ou até mesmo o resgate de conexão afetiva com um dispositivo eletrônico do passado que tem um significado especial para aquela pessoa.
Dentro dessas lojas, é possível testar os dispositivos (desde que você não incomode os atendentes) e, com sorte e conhecimento técnico, encontrar verdadeiras joias escondidas. E como o brasileiro é mais ou menos um especialista em comprar produtos de segunda mão, as chances de fazer um bom negócio em Akihabara são enormes.
Um console clássico que precisa apenas de uma limpeza pode ser adquirido por um preço ridiculamente baixo. Um notebook com defeito fácil de reparar pode retornar à vida e render algum dinheiro nas mãos habilidosas de um técnico. Um celular raro vendido como sucata pode custar uma boa grana na mão de um colecionador.
São oportunidades para quem sabe olhar além da carcaça quebrada ou suja.
De Tóquio a Osaka: onde encontrar as lojas de “junk”
O epicentro desse universo está em Akihabara, em uma área conhecida informalmente como Junk Street. Algumas dessas lojas são visíveis e até populares entre os turistas; outras, mais discretas, estão escondidas em porões ou fundos de lojas convencionais. É preciso curiosidade e faro aguçado para explorá-las.
Fora de Tóquio, outras cidades também cultivam essa tradição. Nakano, ainda na capital japonesa, concentra lojas focadas principalmente em relógios e artigos de cultura pop.
Osaka, em especial no distrito de Namba e sua Denden Town, apresenta uma versão compacta da experiência de Akihabara. Já Kyoto oferece algo ainda mais modesto, com poucas lojas espalhadas principalmente pela Rua Teramachi.
Um mercado para entusiastas e curiosos

O apelo das lojas de lixo vai além do preço. É a possibilidade de redescobrir a tecnologia, de tocar objetos que marcaram época e de, quem sabe, levá-los para casa por um valor irrisório.
É um espaço onde o obsoleto encontra valor e o descartado ganha nova vida — tudo dentro de um sistema informal, mas respeitado. E é interessante ver como esse senso de novo significado para um produto eletrônico pode ser alcançado nas diferentes perspectivas.
Os mais jovens estão buscando as tecnologias do passado para se conectarem com algo mais efêmero e casual, ou até mesmo para compreender como os seus pais e avós se tornaram geeks (e transmitiram essa cultura para eles).
Já nós, os mais veteranos, estamos ali pela nostalgia mesmo. Queremos de volta o mesmo sentimento do passado, quando ganhamos aquele produto de presente ou adquirimos o eletrônico há 20 ou 30 anos atrás, com o dinheiro do nosso primeiro salário.
Mais do que compras, visitar uma loja de “junk” no Japão é uma experiência antropológica. Uma chance de entender como a cultura japonesa lida com consumo, tecnologia e tempo e, com sorte, entender o nosso passado geek.
O que para muitos é entulho, para outros pode ser história — e por uma pechincha inesquecível.

