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Os Simpsons era uma série de TV tão popular, que as pessoas queriam OUVIR a série

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Jamais poderia imaginar que um dia eu testemunharia o fim de ‘Os Simpsons’, mas tudo indica que isso realmente vai acontecer no término de sua 36ª temporada.

A Disney já confirmou que isso vai acontecer, e seus produtores também informaram que não teremos um episódio final da animação. Será um episódio como outro qualquer, porque a vida precisa continuar.

‘Os Simpsons’ é um símbolo de cultura pop global. Um marco na televisão. A maior série de animação da história.

Era tão popular, que seus episódios foram vendidos em fita cassete, para que você pudesse ouvir a rotina da família Simpson em qualquer lugar, na hora que quiser.

 

Entendendo o contexto da época

 

Quando ‘Os Simpsons’ estrearam no final dos anos 80, ninguém imaginava que um garoto amarelo de cabelo espetado, com uma camiseta vermelha e um linguajar carregado de frases como “Eat my shorts” fosse explodir como uma bomba cultural, capaz de resgatar uma rede de TV cambaleante e redesenhar os rumos do entretenimento para adultos.

O cenário da época era o seguinte: a FOX, fundada em 1986, era a prima desajeitada das grandes emissoras americanas, afundada em índices de audiência que fariam qualquer executivo largar o terno e abrir uma barraquinha de cachorro-quente na esquina.

Era tipo a CW quando nasceu. O primo feio dos canais abertos da TV.

Mas aí veio o Bart.

No início dos anos 90, ele não era só um personagem; ele era um movimento. Um manifesto cultural e social. Uma autêntica força da natureza.

O mundo estava em transe por um menino que se recusava a obedecer as regras, escrevendo palavrões no quadro-negro e andando de skate como se sua vida dependesse disso.

Com o tempo, o mundo e, principalmente, o norte-americano médio, também foram seduzidos por Homer Simpson, que se tornou o personagem central da série.

Com o seu lendário de “D’oh!”, ele representava a falência gloriosa do homem comum. Era o reflexo satírico de uma América que, ao invés de se incomodar com as piadas ácidas sobre si mesma, gargalhava em frente à TV.

 

Nunca foi para crianças

O que mais chamou a atenção nisso tudo é que ‘Os Simpsons’ não eram para crianças. Matt Groening e seu time de roteiristas ousavam demais para “uma animação infantil”.

Até aquele momento, desenhos animados eram território sagrado da inocência. Se bem que… personagens como Pica-Pau e Pernalonga, que reinavam nos sábados de manhã nos EUA, tinham várias situações que passavam longe de serem recomendadas para crianças.

Já a FOX decidiu mirar de forma clara nos adultos que queriam rir de suas próprias falhas, suas rotinas absurdas e das ironias da vida moderna.

Colocar um desenho animado no horário nobre foi como lançar um show de heavy metal no meio de uma convenção de música clássica.

E foi um sucesso descomunal.

 

As fitas cassete de ‘Os Simpsons’

Enquanto nos Estados Unidos Bart Simpson estampava camisetas, mochilas e até papel higiênico (porque, aparentemente, nada era sagrado), na Alemanha eles decidiram inovar, transformando os episódios da série em… fitas cassete narradas.

Sim, fitas cassete.

Você apertava o “play” e ouvia uma voz descrevendo, com aquele entusiasmo alemão (o verdadeiro, e não de quem nasceu em Joinville), o que Bart estava aprontando, enquanto o áudio original do episódio corria ao fundo.

Não dava para ver as piadas visuais, mas a entonação compensava. Algo como: “E agora, Bart pisa com cuidado na pista de boliche! Ai, ai, ai, será que ele vai conseguir?”. Era tão excêntrico quanto genial.

Na época, essas fitas eram vendidas como pão quente na padoca do seu Manoel, ao lado de outras adaptações inusitadas de séries de TV.

Porém, enquanto outras histórias mal emplacaram duas fitas, Bart e sua turma conquistaram 15 volumes inteiros.

Em um universo paralelo, talvez você possa imaginar famílias alemãs reunidas ao redor de um toca-fitas ouvindo ‘A Odisseia de Homer’ com o mesmo entusiasmo que ouviriam uma radionovela dramática.

Enquanto isso, nos Estados Unidos, a família Simpson estava ocupada lançando álbuns de música e expandindo o seu império na cultura pop.

“Do the Bartman” era o hit mais improvável, misturando rap e frases de efeito como se Michael Jackson (que, aliás, ajudou a produzir a música) estivesse brincando com os bonecos amarelos da Mattel.

O resultado da parceria entre Bart Simpson e o Rei do Pop foi uma música na Billboard e um videoclipe veiculado na MTV.

O merchandising não tinha limites. Haviam bonecos, lancheiras, e até um jogo de videogame onde Homer perseguia um porco (!) em gráficos pixelados que hoje causariam risos de constrangimento.

 

Um legado eterno

Mas ‘Os Simpsons’ não conquistaram apenas os corações de fãs. A série conseguiu entrar em todos os campos da sociedade, indo da política à igreja, passando pelos meios acadêmicos, mundo esportivo e vários outros segmentos sociais.

Alguns políticos conservadores declararam que a série era um “perigo moral”, enquanto outros argumentavam que a família Simpson representava o que havia de mais genuíno na América: seus erros, suas esquisitices e, no fundo, sua humanidade.

Bart foi proibido em várias escolas, e camisetas com a frase “Underachiever and proud of it!” (Algo como “Incompetente, com orgulho!”) foram queimadas em nome da moralidade.

Sim. Hipocrisia pura do povo norte-americano.

Mas um sinal claro de que a série alcançou o seu principal objetivo: levantar discussões e reflexões críticas sobre o “american way of life”.

Hoje, é difícil imaginar o impacto absoluto de ‘Os Simpsons’ naquela época. Para muitos, a série foi muito além de mero entretenimento, pois foi o reflexo das aspirações, medos e absurdos de, pelo menos, três gerações completas de norte-americanos.

Nenhum produto televisivo chegou perto de alcançar esse impacto.

E para quem acha que isso ficou no passado, basta dar uma olhada no streaming, que (muito provavelmente) será a casa eterna de ‘Os Simpsons’.

Será no Disney+ que você vai encontrar Springfield, intacta, com sua cidade bizarra, seus personagens inconfundíveis e sua capacidade inigualável de transformar até mesmo uma fita cassete alemã em um objeto de desejo nostálgico.


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