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Por que Anora pode perder o Oscar de Melhor Filme, mesmo sendo o favorito

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Anora surge como a grande aposta da temporada, acumulando prêmios e indicações que o colocam à frente da concorrência. No meu mundo perfeito, venceria o Oscar 2025 como Melhor Filme, pois é o mais ousado, provocador e diferente da lista.

Mas o Oscar não é (nem de longe, muito pelo contrário) apenas uma questão de favoritismo ou de méritos artísticos. O sistema de votação, as tendências históricas e a matemática por trás das premiações mostram que nem sempre o favorito absoluto leva a estatueta.

Vamos tentar entender por que Anora, mesmo sendo considerado um dos favoritos para vencer o prêmio máximo do Oscar 2025, pode perder nessa categoria para uma concorrência que existe e tem também ótimos motivos para levar o careca dourado para casa

 

A força de Anora na corrida pelo Oscar

O novo filme de Sean Baker carrega o DNA do cinema independente, mas com um impacto estrondoso na temporada.

Anora venceu a Palma de Ouro em Cannes, dois BAFTAs e está indicado a seis Oscars, incluindo Melhor Atriz para a brilhante Mikey Madison.

O filme mantém a tradição recente de reconhecimento à produções fora do mainstream, como aconteceu com Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo, CODA (No Ritmo do Coração) e Parasita, todos eleitos como Melhor Filme nos seus respectivos anos.

Aliás, o histórico recente do Oscar joga a favor de Anora. Dos últimos quatro vencedores em Melhor Filme, apenas Oppenheimer em 2024 pode ser considerado um filme mainstream, e essa vitória foi encarada como um retorno do cinema blockbuster ao lugar de prestígio e reconhecimento nas premiações.

Ao analisar estatísticas e premiações anteriores, o Hollywood Reporter calcula que Anora tem 52% de chance de vencer, um número impressionante quando comparado com os concorrentes diretos na categoria.

As vitórias nos Critics Choice, Producers Guild e Director’s Guild Awards impulsiona ainda mais suas probabilidades, já que esses prêmios costumam antecipar o vencedor do Oscar.

Dito tudo isso…

O grande problema de Anora neste momento não é Emilia Pérez ou Ainda Estou Aqui. É o tal do “inimigo oculto”, que é famigerado e muito questionável sistema de votação para Melhor Filme.

 

O problema do sistema de votação

Apesar do favoritismo teórico e até mesmo matemático, Anora pode esbarrar no sistema preferencial de votação do Oscar.

O método é válido apenas para a categoria de Melhor Filme, já que todas as outras se valem da eleição direta pelo candidato mais votado.

A categoria Melhor Filme redistribui votos das produções menos votadas até que uma alcance 50% de PREFERÊNCIA dos votantes, e não 50% (+1) DOS VOTOS COMO FILME VENCEDOR.

Em termos práticos: você coloca os filmes na sua ordem de preferência, e o sistema vai descartando da lista aqueles menos preferidos pela maioria, até que sobra a produção que, na média, foi a mais mencionada, independentemente de ser considerada a melhor pela maioria dos votantes.

Sim, eu sei… é confuso até para mim.

Pelo histórico, o sistema de votação para Melhor Filme tende a beneficiar histórias que geram consenso. O que passa bem longe de ser o caso de Anora, uma obra independente com forte personalidade, que tende a dividir opiniões por sua autenticidade e estética graficamente explícita.

Considerando essa sensível questão para a escolha de um vencedor, o principal concorrente de Anora para Melhor Filme no Oscar 2025 neste momento responde pelo nome de Conclave.

Com um perfil menos polêmico (por que “é mais fácil bater na Igreja Católica Apostólica Romana quando a maioria das pessoas de um país segue uma religião anglo saxônica ou protestante”) e um estilo que agrada uma maior parte dos votantes, o filme pode se tornar a escolha segura da Academia.

O Oscar, afinal, prefere o caminho do meio, e obras mais ousadas frequentemente perdem espaço para alternativas mais convencionais.

Provocações à parte da minha parte, Conclave é um dos meus filmes favoritos, e é um dos melhores na lista do Oscar. Mas quando comparado com Anora, é bem menos “tiro, porrada e bomba”, mesmo tratando de temas sensíveis para a Igreja Católica.

 

O Oscar quer se esquivar das polêmicas

A controvérsia sempre foi um fator decisivo no Oscar, e não faltam casos históricos de injustiças e até roubos nas escolhas dos vencedores.

O ano de 1999 que o diga, não é mesmo, Gwyneth Paltrow?

O caso de Anora se assemelha a outros filmes que dividiram a crítica e o público, como Emilia Pérez, que perdeu força após as polêmicas envolvendo Karla Sofía Gascón. Até mesmo as declarações de Jacques Audiard sobre suas decisões criativas que ignoram completamente a profundidade dos temas centrais que ele trabalhou no filme espantaram os votantes.

Seria uma indigesta surpresa se Emilia Pérez vencesse como Melhor Filme ou até mesmo como Melhor Filme Internacional. E é aqui que Ainda Estou Aqui pode ter a grande chance de vencer um Oscar para o Brasil.

Fiquem de olho nessa possibilidade.

Produções como Duna 2 e A Substância, por pertencerem a gêneros como terror e ficção científica, também sofrem com resistência de votantes mais conservadores.

Como Duna ainda terá uma terceira parte (e, essa sim, deve receber todos os prêmios possíveis por ser uma conclusão de saga), o segundo filme não terá o reconhecimento que poderia receber, mesmo que entregasse a melhor história desse Oscar.

E o grande prêmio de A Substância é devolver para Demi Moore uma carreira digna e, com alguma sorte, vencer o Oscar de Melhor Atriz, algo que nem mesmo a Demi acreditava que isso seria possível um dia.

Apesar do prestígio de Anora, sua vitória está longe de ser garantida. O histórico da premiação mostra que a Academia tende a evitar riscos e apostar no que soa mais confortável.

Se a tradição se mantiver, Conclave ou outra alternativa segura podem roubar o holofote, deixando Anora como mais um caso de favoritismo frustrado.

Se Anora perder o Oscar de Melhor Filme para Conclave, ainda vai. Só não pode perder para Emilia Pérez, pois isso seria um roubo no nível “Crash – No Limite derrotando O Segredo de Brokeback Mountain”.

Pior: Cinderela Bahiana (isso mesmo, o nome desse filme está escrito errado no título – o correto é BAIANA) derrotando O Resgate do Soldado Ryan, o que seria uma forma de absolver Shakespeare Apaixonado do roubo cometido em 1999.


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