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Oscar 2024 mostra que Hollywood “voltou ao normal”, e isso não é tão bom quanto parece

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A vitória de “Oppenheimer”, cinebiografia de J. Robert Oppenheimer com direção de Christopher Nolan como Melhor Filme do Oscar 2024 mostra que Hollywood decidiu “voltar ao normal”, depois de passar cinco anos premiando filmes independentes e de plataformas de streaming.

Um dos maiores blockbusters do ano (mais de 957 milhões de dólares arrecadados ao redor do mundo), “Oppenheimer” é a forma da Academia de Hollywood mostrar para todo o mundo que voltou os olhos para as grandes produções, com efeitos visuais impressionantes, histórias épicas e elevado orçamento.

É basicamente a volta dos holofotes ao cinema “tradicional”, o que pode asfixiar obras menores e mais autorais. E é preciso refletir sobre tudo isso.

 

Filmes épicos no lugar de grandes histórias

É uma dinâmica complexa e, ao mesmo tempo, simples de entender.

“Oppenheimer” é um exemplo clássico do cinema tradicional de Hollywood, com um orçamento colossal, um elenco de estrelas e uma narrativa emocionante que combina drama pessoal com eventos históricos de grande escala.

O filme se encaixa na categoria de “grande sucesso de prestígio”, que agrada tanto ao público quanto à crítica, e sua vitória nos Oscars é um reconhecimento do poder do cinema tradicional em cativar e emocionar.

Por outro lado, as plataformas de streaming saíram como grandes derrotadas do Oscar 2024, e nem todo o orçamento do mundo salvou algumas produções do fracasso na premiação.

Netflix e Apple investiram pesado em filmes para o Oscar, e somaram 32 indicações. O resultado de tudo isso foi uma única vitória, com o curta-metragem “A Maravilhosa História de Henry Sugar”, de Wes Anderson para a Netflix.

O caso da Apple é dramático e chamativo. Seus três filmes, “Argylle”, “Napoleão” e “Assassinos da Lua das Flores” custaram nada menos que US$ 700 milhões (o longa de Scorsese devorou US$ 215 milhões), e não receberam nenhum Oscar este ano.

O fracasso das plataformas nas premiações pode ser interpretado como um sinal de que Hollywood está repensando sua relação com o streaming. Relação esta que, convenhamos, nunca foi considerada das melhores ou mais saudáveis.

Considerando as enormes esnobadas em “Roma” e “Ataque dos Cães”, filmes que tinham condições muito melhores para vencer o Oscar de Melhor Filme que “Maestro”, a Academia de Hollywood sempre olhou para as plataformas de streaming como inimigas do cinema tradicional.

E desconfio que “CODA – No Ritmo do Coração” só venceu o Oscar em 2022 porque foi “o Oscar da pandemia”, e todo mundo estava pensando mais em salvar a própria vida do que em assistir e analisar filmes a sério. Sem falar que os votantes mais velhos que não sabem usar o WhatsApp ou o Messenger do iPhone não conseguiram combinar os votos dessa vez.

A indústria cinematográfica tradicional está claramente tentando fortalecer seu papel como criadora de grandes espetáculos e experiências cinematográficas únicas, que não podem ser replicadas em casa. Ao mesmo tempo, tenta resgatar a sua hegemonia na influência junto à audiência, já que sempre foi referência do que era o verdadeiro cinema.

A má notícia para Hollywood: essa ideia caiu por terra, já que o streaming chegou para nunca mais sair de nossas vidas.

 

Um novo capítulo para Hollywood

Christopher Nolan fez tudo certo em “Oppenheimer”.

Contou a jornada conturbada de J. Robert Oppenheimer (Cillian Murphy, vencedor do Oscar de Melhor Ator), explorando o dilema moral e o peso da responsabilidade que ele carregou como líder do Projeto Manhattan, responsável pela criação da bomba atômica, mostrando sua vida pessoal e relacionamentos complexos.

Nolan contou sua história de forma complexa, com efeitos visuais inovadores e construindo um universo cinematográfico imersivo, transportando o espectador para o coração da corrida armamentista e despertando questionamentos filosóficos sobre o poder da ciência, o custo do progresso e a ética da guerra.

Entendo que “Barbie” é sim o filme de 2023. Ele salvou o ano no cinema. Mas “Oppenheimer” é sim o melhor filme da temporada, e consolida Nolan como um dos cineastas mais conceituados da atualidade.

E é Christopher Nolan quem inicia um novo capítulo em Hollywood, o que pode ser um enorme problema.

Os filmes independentes podem ser descartados para que o blockbuster tradicional receba o prestígio e o reconhecimento. Porém, sem os prêmios, filmes como “Moonlight”, “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”, “Parasita” “Nomadland” e “CODA” jamais seriam sequer mencionados junto ao grande público.

O cinema é sim uma experiência coletiva e reflexiva, mas grandes histórias não dependem de um orçamento de US$ 200 milhões. E virar as costas para o streaming é um erro grosseiro, pois o grande público já abraçou essa proposta para assistir filmes em casa ou em qualquer lugar.

Acredito que todos vão reavaliar suas estratégias diante dos resultados do Oscar 2024… menos a Academia de Hollywood. O que é péssimo. Buscar um equilíbrio entre qualidade nas histórias e visibilidade nos projetos menores seria o mundo perfeito para a indústria e os fãs. Mas não me parece que é isso o que vai acontecer.

Hollywood voltou ao normal. Nolan tem o seu Oscar de forma merecida.

Mas o recado do roteirista de Ficção Americana precisa ser ouvido com atenção e fixado como meta para a indústria do cinema.

Vamos apostar US$ 200 milhões em 10 filmes que custam US$ 20 milhões. E, quem sabe, vamos receber mais ótimas histórias para o grande público.

Tudo o que o fã de cinema quer é boas histórias. E qualidade só se extrai a partir da quantidade.


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@oEduardoMoreira