As coisas mudam. Em alguns casos, elas se transformam. E está mais do que na cara de todo mundo (menos é claro na dos gananciosos executivos de Hollywood) que as pessoas não estão encarando o cinema da mesma forma que faziam no passado.
O mundo se modernizou, e diferente do que Martin Scorsese acredita, a experiência cinematográfica é hoje algo que passa pelos mais diferentes dispositivos e formatos… inclusive uma tela grande dentro de uma sala escura, que permite o consumo de pipoca a R$ 50 o pacote.
A forma como consumimos cinema passou por mudanças drásticas na última década. E essa transformação também alterou a percepção entre sucesso e fracasso de um filme, já que vários projetos falidos ganharam nova vida no streaming.
O streaming ressuscitando alguns filmes
Alguns fracassos de bilheteria se transformaram em sucesso repentino quando ganharam uma segunda chance no streaming. Três claros exemplos disso em um passado não muito distante são: “Elementos”, “O Esquadrão Suicida” e “Mortal Kombat”.
Cada um desses filmes naufragou vergonhosamente nos cinemas, mas reconquistaram alguns corações quando chegaram no streaming. O que mostra que salas vazias e pouca procura só significam mesmo que a bomboniere continua cara, e que pagar o preço de um combo pipoca + refrigerante é o mesmo que pagar a mensalidade do Max faz com que a conta não feche de jeito nenhum.
O último sucesso inesperado do streaming é “As Marvels”, que foi um fracasso nas bilheterias, mas é o filme mais assistido do Disney+ neste momento. Aqui, a tese dos filmes encontrarem o sucesso em um formato mais democrático e menos caro está mais uma vez provada, mas com adendos.
“As Marvels” conseguiu superar inclusive superar os dois filmes que foram beneficiados por esse fenômeno: o já mencionado “Elementos” e “Moana”, o que é surpreendente se considerarmos a elevada rejeição que o projeto recebeu inicialmente.
As pessoas aprenderam a controlar o FOMO
Eu escrevi um artigo recentemente falando sobre essa mudança de comportamento. As pessoas estão preferindo esperar para ver alguns filmes no streaming do que gastar o tempo e o dinheiro indo aos cinemas, e isso é perfeitamente explicável.
O streaming entrega aquele mesmo conteúdo apenas semanas ou meses depois da estreia nos cinemas. Comparando com os tempos das locadoras (onde o mesmo filme passava antes na TV por assinatura), esse tempo é quase nada. Dá para esperar em boa parte dos casos.
Falando especificamente de “As Marvels”, muitos optaram por aguardar o filme chegar no Disney+ para conferir se ele era essa bomba que todo mundo contou. E o mesmo fenômeno está se repetindo para outros filmes.
As pessoas estão abandonando essa tendência de sair correndo para assistir a um filme apenas porque é uma estreia. A conveniência de receber esse conteúdo em casa com uma boa qualidade e as assinaturas custando o preço de um ingresso ajudam neste processo de elevado consumo doméstico dos filmes.
Dessa forma, o FOMO (Fear Of Missing Out) deixa de ser um problema para muitas pessoas, que podem esperar pacientemente pela estreia do filme no streaming.
Eu mesmo estou pensando seriamente em abandonar a minha carteirinha de plano família do cinema do shopping. Ainda mantenho porque pago muito barato por filme assistido (em média, R$ 10). Mas o tempo gasto no deslocamento e os eventuais valores adicionais pagos em algo para comer estão me ajudando a repensar a decisão.
Logo, ver “As Marvels” sendo um sucesso no Disney+ nem chega a ser uma surpresa. É apenas a constatação da mudança de comportamento do coletivo.
Para desespero dos executivos de Hollywood.