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Uma IA pode decidir o que você vai jantar?

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A Inteligência Artificial quer ocupar vários setores da humanidade. Porém, isso pode ser algo muito perigoso, pois algumas funções só estão destinadas aos humanos. Ou, no meu caso, só eu mesmo posso escolher o que quero comer em um restaurante.

Em San Francisco (EUA), uma empresa está preparando uma ferramenta que pode sugerir o prato do seu jantar tão logo você se aproxime da tela para acessar o cardápio. A escolha vai depender das suas características pessoais e até do seu ânimo.

Todas as opções são selecionadas pela IA, e é o usuário que vai escolher os pratos que vão para a mesa. Até porque ninguém pode abandonar de uma hora para a outra a ideia do “o cliente sempre tem a última palavra”.

Até isso precisa ser feito aos poucos.

 

Cara de salada? Ou cara de hamburguer?

A empresa Raydiant é a responsável pela IA em desenvolvimento que vai sugerir as nossas refeições a partir do nosso ânimo ou características corporais. A tecnologia deve chegar ao mercado no final de 2022, e tem como principal objetivo oferecer uma experiência otimizada para os clientes, entregando a melhor e mais personalizada refeição possível.

Isso… e aumentar as vendas dos estabelecimentos que, depois da pandemia, precisam fazer qualquer coisa para convencer as pessoas que é sim possível obter uma refeição diferenciada, e que isso justifica a saída de casa para investir dinheiro em comida.

O sistema funciona a partir de um conceito que usa um combinado de câmeras que podem reconhecer algumas das características consideradas essenciais de cada cliente para determinar o que aquela pessoa realmente quer comer. Ou pelo menos sugerir um prato que pode dar uma animada naquela cara de derrotado.

Os parâmetros adotados para definir qual é a melhor refeição para o cliente naquele momento são semelhantes aos que já vimos em outros sistemas com as mesmas características. Porém, os responsáveis por esse projeto garantem que a raça e o tamanho do corpo do cliente ficaram de fora do leque de categorias que a IA vai gerenciar.

Outros aspectos são analisados de forma mais enfática. Alguns são evidentes, e outros traços são bem sutis. Por exemplo: idade, hora do dia, o já mencionado estado de ânimo do cliente ou o gênero da pessoa.

O grande desafio de uma IA é detectar e considerar os tais traços menos evidentes das características do cliente. Por exemplo, se ele é vegano, se é judeu, as rugas no rosto, se ele está alegre ou deprimido, entre outros. Tais características são analisadas pelo software através de uma paleta de fatores que inclui informações que podem parecer completamente aleatórias como, por exemplo, a meteorologia.

Isso é importante porque a IA é treinada para perceber esses pequenos traços da personalidade do indivíduo em função dos eventos que ocorrem ao seu redor. No caso das pessoas que não gostam de chuva, é possível perceber um certo descontentamento no olhar, uma desanimação ou uma expressão facial que mostra descontentamento com relativa facilidade. Ou pelo menos o software que vai escolher o seu jantar consegue fazer isso.

Esse coquetel de fatores é analisado para entregar o prato perfeito para aquele indivíduo, na tentativa em oferecer uma experiência cômoda, digital e personalizada. E um dos grandes desafios dessa tecnologia ainda está nos preços que são cobrados por soluções como essa.

De qualquer forma, os resultados são muito interessantes. De acordo com os responsáveis pela iniciativa, os clientes que vivem essa experiência se sentem confortáveis com o recurso, e isso pode ajudar a impulsionar a fidelidade dessas pessoas com o estabelecimento em questão.

Vale lembrar que a ferramenta da Raydiant mão é a primeira que tenta definir o que é melhor para as pessoas em um aspecto tão importante da vida como é a escolha de uma refeição em um restaurante. Em 2019, o McDonald’s fechou uma parceria com a Dynamic Yield para personalizar a experiência do autoatendimento de suas unidades. E em 2021, a gigante do fast food anunciou o desejo de venda dos resultados alcançados para a Mastercard.

Até agora, tudo certo. Porém…

 

Como fica a questão da privacidade do usuário?

Os leitores mais atentos já perceberam algo que todo mundo deveria ter sacado logo de cara. Mas como a minha missão é deixar o assunto bem esclarecido, sou eu que levanto essa pergunta no artigo.

Para que o sistema da Raydiant funcionar, ela precisa de um enorme volume de dados para determinar os seus parâmetros para oferecer o melhor prato para um cliente. E nesses dados, incluem aspectos pessoais dos clientes. Por exemplo, o estado de ânimo e as reações quando algo não dá certo ou em função de aspectos de sua vida que nem sempre queremos que venham a público.

Por exemplo: é da conta de alguém que você não conhece saber que você não gosta de dias de chuva? Quem mais vai saber que você está menstruada? E se você está preocupado porque foi ameaçado de morte? Como uma empresa vai lidar com essa informação?

Até o momento em que escrevi este artigo, não há maiores detalhes sobre como a Raydiant vai trabalhar com esses dados que, de forma quase inevitável, serão coletados de forma voraz e vertiginosa pela sua tecnologia. Logo, não existe qualquer tipo de garantia que as suas informações sobre o seu comportamento não serão vendidas para outras empresas sem você saber.

E pior: sem você ter qualquer tipo de controle sobre isso.

Além disso, também não existem garantias se a IA que vai trabalhar para essa detecção de ânimo será a única a coletar e trabalhar com as informações sobre o comportamento dos clientes e, mesmo assim, para seguir evoluindo, vai precisar de um volume maior de dados que, coincidência ou não, são outras pessoas diferentes daquelas que já foram analisadas.

A empresa responsável pela tecnologia da IA garante que tudo foi desenvolvido para respeitar a privacidade dos usuários, e todas as informações serão processadas de forma anônima. Além disso, existe a garantia que os dados não serão salvos de forma individualizada, e que nada será vendido para outras empresas.

Mas isso, na teoria. Já ouvimos essa história tantas vezes, que fica difícil acreditar que essa tecnologia será utilizada apenas para os restaurantes e fast foods que conseguem oferecer um serviço rápido para os seus clientes. Na teoria, tudo é lindo. Na prática, muita coisa tem a cara do Facebook (e eu espero que você tenha entendido a referência neste caso).

Recomendo fortemente que todos nós (eu, inclusive) esperemos por mais alguns meses, até descobrir o que essa tecnologia virou na prática. Eu me odiaria se meus dados fossem roubados de forma descontrolada e sem qualquer tipo de critério.

No papel, a ideia é ótima (mesmo um pouco preocupante). Mas quero ver quais serão os efeitos práticos da iniciativa.


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@oEduardoMoreira